quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Os Trabalhos da Mão
Alfredo Bosi

A mão arranca da terra a rais a erva , colhhe da árvore o fruto, descasca-o, leva-o à boca.Amão apanha o objeto,remove-o, achega-o ao corpo , lança-o de si. A mçao puxa e empurra junta e espalha,arrocha e afroxa, contrai e distende , enrola e desenrola; roça, toca,apalpa.acaricia,belisca unha , aperta,esbofeteia, esmurra;depois, massageia o músculo dorido.

A mão tacteia com as pontas dos dedos , apalpa e calca com a polpa , raspa , arranha, escarva, escarifica e escarifuncha com as unhas.Com o nó dos dedos, bate.

A mão abre a ferida e a pensa. Eriça o pêlo o alisa. Entrança e destrança o cabelo. Enruga e desenruga o papel e o pano.Unge e esconjura, asperge e exorciza.
Acusa com índez, aplaude com as plamas, protege com a concha. Faz viver alçando o pelegar; baixando-o, manda matar.
Mede com a palma, sopesa com a palma

Aponta com gestos o eu , o tu, o ele; o aqui, o ai, o ali; o hoje o ontem, o amanha; o pouco o muito, o mais ou menos; o um , o dois, o tres, os números até e os seus múltipplos e quebrados. O não, o nunca, o nada.

É voz do mudo , é voz do surdo, é a leitura do cego

Faz levantar a voz, amaina o vozeiro, impõe silencio.Saúda o amigo balançando leve ao lado da cabeça e , no mesmo aceno, estira o braço e diz adeus. Urge e manda parar. Traz ao mundo a criança, esgana o inimigo.

Essaboa a roupa, esfrega, torce,emxágua, estende- a ao sol, recolhe- a dos varais, desfaz-lhe as pregas, dobra-a, guarda-a

A mão prepara o alimento. Debulha o grão, despela o legume, desfolha a verdura, descama o peixe, depena a ave e a desossa. Limpa [...] A mão joga a bola e apanha e rebate.
Soergue-a e deixa-a cair.

A mão faz som:bate na perna e no peito, marca o compasso, percute o tambor e o pandeiro, batuca, estala as asas das castanholas, dedilha as cordas da harpa e do violão, dedilha as teclas do cravo e do piano, empunha o arco do violino e do violoncelo, empunha a tubo das madeiroas e dos metais. Os dedos cerram e abrem o caminha do sopro que sai pelos furos da flauta, do clarim e do oboé . A mão rege a orquestra.

[...]

Para perfazer tantíssimas ações basta-lhe uma breve mas dúctil anatomia: oito assinhos no pulso, cinco no metacarpo e nos dedos com a suas falanges, falanginha e falangetas.

BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Pauo, Cultriz/Usp.1977

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